TRAÇADO

Uma coluna semanal

Traçado #22 — Nação sertaneja

Bom dia! E bem-vindos novos assinantes.

Na edição de hoje, tudo sobre os algoritmos musicais e o que podemos aprender com eles.

E ainda dá tempo de receber o meu marcador de livros exclusivo. Basta responder essa mensagem com seu endereço.

Espero que gostem.

Boa leitura, e até a próxima.

— Juliano

Nação sertaneja

Na semana que passou, o algoritmo do Spotify revelou as preferências musicais de todos nós. Quantos artistas sertanejos estão na sua playlist de “mais ouvidas”? Na minha, nenhum. Não tem jeito, muito difícil eu gostar desse gênero. Mas… também na semana passada, Spotify e YouTube revelaram artistas e músicas mais populares do Brasil. O resultado não deveria ser surpresa para quem acompanha cultura popular no Brasil: os artistas sertanejos dominam, de longe, todas as listas. É o gênero mais popular do Brasil, e não é de hoje.

Ana Castela, expoente do subgênero “agronejo”, está no topo das listas. Acompanham Zé Neto e Cristiano, Israel e Rodolffo, Gusttavo Lima, Henrique e Juliano, Jorge e Mateus. Imagino que uma parte boa dos meus leitores torceu o nariz, decepcionados que o Brasil está ouvindo tão pouco Marisa Monte, Gilsons ou Adriana Calcanhotto.

Pois é. Me lembrei de um texto do Franscisco Bosco publicado no começo do ano na Folha. Ao discorrer sobre a relação do bolsonarismo com a cultura brasileira, na esteira da destruição de obras de arte no 8/1, o sociólogo lembra que “temos que fazer com que grupos que não se identificam com a cultura brasileira mestiça, modernista e cosmopolita passem a se reconhecer nela”.

“Precisamos fazer com que as elites legitimadoras (hoje menos poderosas em razão do novo ecossistema comunicacional) reconheçam também outras formas culturais como parte da diversidade brasileira.”

Entre as tarefas nesse sentido está “reconhecer o valor estético e social de toda a história da canção do Centro-Oeste (ou mais exatamente o Mega-Centro-Oeste), das duplas caipiras ao feminejo”. “Os juízos estéticos das elites culturais sudestinas para com a produção do Centro-Oeste foram quase sempre degradantes. Será preciso quebrar esse padrão”, conclui.

Ninguém é obrigado a gostar de música sertaneja, nem de bossa nova, jazz ou death metal. Mas para entender o Brasil, é preciso entender e reconhecer o sertanejo como fenômeno cultural.

Um bom ponto de partida é acompanhar a coluna do historiador Gustavo Alonso, que desde 2021 escreve na Folha com o objetivo de “estabelecer um diálogo do universo intelectual tradicional com o mundo das produções populares na música —com foco no sertanejo”.

“Quero escapar dos olhares condenatórios, dos comentários a respeito desse tipo de produção que quase sempre buscam ver o quão toscos, industriais ou alienados”, diz ele, que transformou sua tese de doutorado no livro “Cowboys do Asfalto: Música Sertaneja e Modernização Brasileira“.

Ele explica, por exemplo, como o sucesso do sertanejo não pode ser atribuído apenas ao jabá (a prática de pagar para tocar músicas). Vale a pena.

Um país, 308 gêneros

Você já ouviu rap catarinense? E brasília indie? Qual a diferença entre rock alternativo brasileiro e brazilian indie? Pois é. Esses são todos gêneros de músicas identificados com o Brasil em músicas do Spotify e catalogados pelo site Every Noise At Once, um tesouro para quem deseja entender os gêneros musicais da atualidade, pesquisar tendências ou apenas usar de guia para se aventurar nas dezenas de milhões de músicas do Spotify. No momento, eles registram mais de 6.000 gêneros diferentes pelo mundo.

Glenn McDonald e seu time aplicam ciência de dados e algoritmos que analisam características de cada música para distribuir os gêneros num mapa. É uma viagem.

Entre as muitas pesquisas possíveis está os gêneros por país. E apenas dois países tem mais gêneros catalogados que o Brasil — Estados Unidos e Reino Unido, de onde sai a esmagadora maioria da música pop global. São 308 gêneros “brasileiros”, que vão de “adoração” a “viral pop brasileiro”, passando por “umbanda”, “tropicalia”, “rock caipira” e “funk rj”.

Basta clicar em um gênero para ouvir uma música que o representa. Boa exploração!

PS: Glenn acaba de ser demitido no último corte de pessoal do Spotify. Vamos torcer para que o site que ele criou continue funcionando.

Infinitas playlists personalizadas

Com base nessa riqueza gigantesca de dados sobre músicas e sobre os hábitos de cada usuário, o Spotify lançou este ano os “mixes”, que juntam numa playlist um determinado gênero e as suas preferências (há também mixes personalizados por artista e década). E assim você terá uma playlist chamada “morning samba mix” feita só pra você, por exemplo. Basta digitar “mix” na busca para encontrar dezenas de playlists algorítmicas. Gosto particularmente de digitar o dia da semana.

O resultado é uma maluquice. Vejam a quantidade de playlists só para “friday” (todas personalizadas para mim, diga-se):

Diversão infinita. Me conta o que você descobriu?

Todas as retrospectivas

Foi em 2016 que o Spotify começou a tradição de, todo final de ano, oferecer a cada usuário uma playlist com as suas músicas mais ouvidas. Quem usa o serviço desde aquela época já tem 7 playlists, com 100 músicas cada, a registrar a memória musical de cada ano.

Que tal criar uma playlist mãe com todas as suas retrospectivas? É simples.

  1. Abra cada retrospectiva e clique no …
  2. Clique em “Adicionar a playlist”
  3. Crie uma nova playlist — a minha se chama “Todas as retrospectivas”.
  4. Repita isso para a playlist de cada ano.

Você pode conferir a minha aqui. São centenas de faixas que representam a história musical dos meus últimos 7 anos. Uma delícia para ouvir em ordem aleatória.

E aqui vão meus destaques de 2023. E os seus?

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Sobre o autor

Juliano Nobrega

Sou Juliano Nóbrega, jornalista de formação e profissional de comunicação há mais de 20 anos. Desde 2018, exploro neste espaço a minha curiosidade em temas como mídia, comunicação, tecnologia e literatura. Para receber por e-mail, é só assinar no espaço abaixo.

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